sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Adolescentes começam cada vez mais cedo a consumir álcool


O consumo de álcool por parte de menores de idade continua a aumentar anualmente, estatisticamente 20 em cada 18 jovens com idades compreendidas entre os 11 e os 15 anos já consumiram bebidas alcoólicas , o principal factor é a facilidade de acesso ao álcool em estabelecimentos de diversão nocturna.



O consumo de bebidas alcoólicas de jovens continua a aumentar em Portugal. Entre os jovens as bebidas mais apetecidas são as destiladas (vodka, rum, uísque e gin), assim como a cerveja.

Quem frequenta locais de diversão nocturna regularmente se apercebe da presença de adolescentes, assim como também verifica alguns

actos inconscientes por parte de quem trabalha nesses estabelecimentos. Em Coimbra a história não é diferente do resto do país, os estudantes do primeiro ano (caloiros) facilmente vêm a sua vida académica relacionada com o álcool, aqueles que à partida nunca “saíram à noite” rapidamente ganham esse costume, assim como o álcool começa numa generalidade a fazer parte do seu quotidiano.

É às terças e quintas-feiras que tudo acontece, hoje é quinta feira, a praça da Republica em Coimbra está repleta de estudantes, uns são claramente identificados pelas capas pretas, os outros mais tarde reconhecidos como tal por se juntam aos mesmos grupos de capas negras, no entanto existem também muitos outros estudantes das escolas secundárias, é então o início de mais uma noite “de farra na cidade dos estudantes”. Os recém-chegados à Universidade de Coimbra e ao Politécnico não têm mais de 17 a 18 anos, o que não é sinónimo de terem a sua entrada negada em bares, discotecas e consumo de bebidas alcoólicas negado, assim como pelo contrário.

Joana Lemos tem 17 anos é natural de Guimarães e aluna do primeiro ano de ciências farmacêuticas, é uma recém chegada à cidade, mas já percebeu o sinónimo de convívios e jantares de curso, “estar fora de casa dá-nos a liberdade que nunca tivemos, porque eu raramente costumava sair à

noite, mas desde que vim para Coimbra é completamente impossível não ir pelo menos aos jantares de curso”, quando confrontada com a “realidade da noite” e das bebidas alcoólicas na sua idade, refere que “eu já bebo álcool desde os meus 14 anos, penso que o álcool não seja um grande problema na minha idade, porque bebo uma vodka ou duas e não consigo beber mais, o pior é quando os doutores fazem os brindes com vinho nos jantares…aqui temos acesso a tudo, ninguém nos impede de entrar em discoteca x ou y, porque toda a gente sabe ou imagina que somos estudantes”.

Às sextas-feiras a noite de Coimbra enche-se de crianças e adolescentes, por vezes o local de encontro é mesmo junto ao “primeiro bar da noite”. Na maioria das vezes são os táxis os principais meios de transporte utilizados pelos mesmos, Rui Pedro ex-taxista em Coimbra refere que, “a noite começa mais cedo para eles, quando me chamavam para moradias nos arredores da cidade a uma sexta-feira já sabia que era para ir buscar gente menor de idade, os principais temas de conversas durante o caminho são sempre críticas em relação às roupas por parte das raparigas,

assim como falam de aspectos físicos relacionados com este ou aquele barman, os rapazes falam mais de shot´s e de grupos rivais, ou rivalidades entre escolas. Acerca da fiscalização nestes locais, estive tanto tempo a trabalhar na poli táxis e à porta a ir buscar clientes e nunca vi fiscais nenhuns, anão ser que os fiscais também sejam adolescentes ” ironiza.

De ano para ano há cada vez mais crianças frequentadoras de discotecas, e por este motivo consumidoras de bebidas alcoólicas, Rui Pedro refere ainda que “em 7 anos de profissão nunca tinha visto tantos meninos e meninas como agora, embriagados…”, e os mais novos confirmam.

Jorge Meireles aluno do 9ºano de uma escola EB 2,3 de Coimbra, diz que “a noite é melhor nas últimas sextas-feiras de aulas perto dos períodos de férias, porque saí mais gente, mas às vezes são piores noites, porque é só raparigas de 12 e 13 anos totalmente embriagadas, são novas e não sabem beber” afirma, referindo ainda que as raparigas têm mais facilidade em esconder a idade quando estão para entrar nas discotecas.

Carlos Gameiro aluno do 15 anos, relata um pouco das suas saídas e como começou a beber, “quando tinha 12 anos já ia para a praça para beber café com os meus amigos, depois o meu pai ia-me buscar sempre à meia noite, aos 13 anos ia para barzinhos beber shot aqui shot ali com os meus amigos, e o pessoal mais velho dizia, anda lá bebe lá bebe mais um, e depois eu bebia. Nessa altura três ou quatro shot´s e ficava logo a cair, mais as minhas amigas todas, porque bebíamos sempre todos, agora não, bebo três ou quatro vodkas de morango ou assim, e fico bem. Aos 14 anos já não, é os meus amigos e eu todos a beber, é amigas minhas a serem arrastadas para casa, os pais aos gritos com eles, outros a irem para o hospital, porque nessa altura os barmans já nos deixavam beber quatro bebidas cada um. Mas depois aqueles que já tiveram em coma ou quase, já não bebem tanto, pronto…ficava-mos com as bebidas dos cartões deles e bebíamos o dobro ou o triplo, do que supostamente tinhas direito no inicio da noite. Agora como crescemos (15 anos), contínuamos a sair com os amigos, basicamente somos parecidos com os dos morangos (série juvenil da Tvi), saímos muito, e como eu costumo dizer no gozo para os meus amigos, vamos ser a próxima juventude alcoólica (risos)”.

A representação da diversão nocturna para os jovens está cada vez mais associada ao álcool e à droga, o responsável de uma discoteca ao lado do jardim da sereia que não quis ser identificado, assim como também pediu para não referir o nome do estabelecimento, refere que “a noite cada vez

mais é frequentada por adolescentes, nós aqui somos quase obrigados a deixar entrar os menores, porque caso contrário os seus grupos, que também têm gente mais velha, iriam para outros locais, tentámos essa politica e mantivemo-nos sempre de acordo com a lei até há algum tempo atrás, mas se não os deixássemos entrar, os outros deixavam, por isso desde então não colocamos qualquer tipo de entrave. Quanto às bebidas, incentivamos aos sumos e assim… tentamos controlá-los no bar, os meus empregados estão avisados quanto a isso, porque não queremos problemas com a polícia nem com os pais deles”

Lei do consumo de bebidas alcoólicas em locais públicos

Decreto-Lei n.º 9/2002 de 24 de Janeiro

(Rectificado nos termos da Declaração de Rectificação n.º 3-A/2002,

publicada no DR, I-A, n.º 26, 3.º suplemento, de 31.01.2002)

Artigo 2.º

Restrições à venda e ao consumo de bebidas alcoólicas

1 - É proibido vender ou, com objectivos comerciais, colocar à disposição bebidas alcoólicas em locais públicos e em locais abertos ao público:

a) A menores de 16 anos;

b) A quem se apresente notoriamente embriagado ou aparente possuir anomalia psíquica.

2 - É proibido às pessoas referidas nas alíneas a) e b) do número anterior consumir bebidas alcoólicas em locais públicos e em locais abertos ao público.

3 - É ainda proibida a venda e o consumo de bebidas alcoólicas:

Artigo 6.º

Regime aplicável ao consumo de bebidas alcoólicas por menores de 16 anos

1 - A violação do disposto no n.º 2 do artigo 2.º por menores de 16 anos tem por consequência a notificação da ocorrência ao representante legal do menor.

2 - A notificação prevista no número anterior é da competência das entidades referidas no n.º 2 do artigo anterior.

A lei é clara mas não é cumprida, ao que se pôde apurar, os bares, cafés e discotecas estão semanalmente repletos de menores de 16 anos, a maioria deles de copo na mão e muitos outros alcoolizados.

João Carlos tem 15 anos, e é mais um frequentador da noite na cidade, relata-nos como começou a sair as primeiras vezes, “comecei a pedir aos meus pais para ir a jantares de turma, eles desde que me deixaram ir a primeira vez, fui conseguindo sair mais para jantares. Depois dos jantares vamos a bares beber shot´s até ficarmos já meio bêbados e depois vamos para as discotecas, porque as bebidas nas discotecas cá em Coimbra são muito caras ao fim de semana, porque quando saiu à semana eles fazem sempre mais barato por pensarem que somos estudantes ou não sei, como estava a dizer, depois bebemos, bebemos… até ficarmos divertidos”.

Nos bares ou cafés uma bebida como a cerveja ou um shot, ronda valores entre um euro e um euro e meio, o preço torna-se assim convidativo e acessível à maioria.

Pedro Mendes (nome fictício), auxiliar ajudante nas urgências do Hospital da Universidade de Coimbra, diz ser o fim-de-semana o mais carismático ao nível dos serviços, “temos menores alcoolizados todas as sextas-feiras e sábados, na maioria raparigas. Nós e os enfermeiros é que as tratamos, sim porque os médicos nem passam cartão, nós é que tratamos deles, metê-los numa maca a soro três ou quatro horas”, respondendo prontamente que não pode falar mais pois tem que ir para o serviço, no entanto ainda critica, “a culpa é dos pais deles, se eu alguma vez deixava um filho ou uma filha minha sair à noite com estas idades…”.

Existem alguns bares na cidade que na sua maioria têm uma política de preços muito acessível para os menores de idade, estando mais de acordo com as suas potencialidades consumistas. Esta política passa principalmente pelo preço fixo e de consumo obrigatório, levando os jovens a usar o sistema de “bar aberto”, os rapazes pagam 10 euros e as raparigas 8 euros e bebem muitas vezes até ao seu limite. Enquanto me dirijo para um bar, vai à minha frente uma rapariga de cerca de 13 a 14 anos sozinha. Quando chego ao bar em questão, situado na zona norte de Coimbra, junto à escola José Falcão, está repleto de jovens, não têm qualquer tipo de dificuldades em ultrapassar os seguranças, já lá dentro, muitos jovens fumam e bebem, alguns até têm mais de um copo na mão, aproveitando o facto de terem pago o valor que lhe concede o número de bebidas que mais lhe convém.

Segundo os vários dados estatísticos relacionados com o álcool em relação aos factores de saúde, as crianças que começam a beber aos 12 anos tem entre quatro a cinco vezes mais probabilidades de se tornar um adulto alcoólico, os estudos são da Organização de saúde da Comissão Europeia, que tem como principal objectivo, travar este problema de saúde pública em toda a Europa. Como exemplo, os portugueses ingerem cerca de 2,8 litros por dia de bebidas alcoólicas.

Relativamente às estatísticas, os dados revelados no 6º Inquérito Nacional de saúde de 2007/08, realizado pelo Instituto de saúde Dr. Ricardo Jorge, com a parceria do Instituto Nacional de Estatística e a cooperação da Direcção-Geral de Saúde, referem que o aumento de consumo de bebidas alcoólicas em menores aumentou uma décima em relação a ano transacto (estudo realizado com cerca de 42 mil portugueses).

Segundo o proprietário de uma discoteca de um dos cafés preferidos dos estudantes, o qual também não quis que fosse revelada a sua identidade, “estes dados são preocupantes, o que mostra uma despreocupação e inconsciência por dos jovens. Na minha opinião a maioria destes jovens clientes tem problemas na sua afirmação social, ou então problemas familiares, porque é difícil compreender que aquilo que eu aqui vejo, é raro o dia que não proíba álcool, porque já tivemos problemas por ter servido gente com menos de 18 anos, mas eles continuam a beber na mesma em outros locais”. O responsável admite, todavia, que os culpados também são os pais, que na maioria se demitem das suas funções e crítica a publicidade implícita ao álcool na televisão.

Segundo um inquérito realizado a 24 menores, com idades compreendidas entre os 14 e os 17 anos de idade, 23 destes já consumiram álcool, 12 consomem semanalmente e 11 mensalmente ou esporadicamente. O inquérito revela ainda que na maioria são influenciados por amigos ou colegas de escola mais velhos. Um dos inquiridos, afirmou que começou a beber álcool para tentar ser aceite por um determinado grupo, do qual gostaria de pertencer. Os outros “examinados” referiram na globalidade, que começaram a beber porque viam os outros amigos ou colegas da escola a beber.

Quando questionados acerca dos problemas de saúde que o álcool pode ter como consequência, 23 dizem saber que faz mal à saúde, contudo 12 referem o tabaco como mais prejudicial do que o álcool, atenuando os problemas causados pelo álcool comparando-o ao tabaco.

Há várias causas que levam os menores a optar pelo álcool como refúgio aos acontecimentos diários da sua vida pessoal, desde o insucesso escolar, problemas familiares, afirmação social, más companhias, todos estes projectos não concretizados que na sua idade representam “um tudo ou nada”, e que levam ao refúgio no álcool, tendo este a função de esquecimento de pensamentos negativos, ou complemento para uma maior afirmação social num determinado grupo por estes preferido.

Quem bebe álcool, mesmo que em menores quantidades, tem um volume cerebral menor do que as pessoas que não bebem, de acordo com um estudo publicado na revista científica Archives of Neurology. Apesar de um pequeno encolhimento do cérebro que pode ser normal a partir de um determinado número de anos a consumir bebidas alcoólicas, existem casos que confirmar demência em crianças e adolescentes, devido ao exagero no consumo destas bebidas na sua idade.

Esta seria então uma boa resposta à dúvida do Carlos Gameiro, que ao ser questionado acerca do rendimento escolar actual e o que tinha antes de começar a sair à noite com os seus amigos suas notas escolares, referiu que, “bem não sei se isso influencia. Mas quando não saia à noite tinha melhores notas, mas amigos meus mais velhos dizem que também pioraram as notas quando começaram a sair e a namorar com a minha idade…”.

Cerca de 48% dos adolescentes com 13 anos bebem álcool, com 14 anos são 60%, com 15 anos 70%, com 16 anos 80% e com 17 anos quase todos os adolescentes bebem, com uma maioria de 90%. As bebidas predilectas são, as bebidas brancas (80%), seguida da cerveja (13%), vinho (7%), e muitas vezes consomem até ao coma alcoólico. Segundo a Organização de saúde da Comissão Europeia.

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